25 de dezembro de 2020

A Dourada Proporção

Perdoa-me, anjo terrível dos anos veementes, mas não mais quero mudar a minha vida. Inteligência e lirismo acomodam-se agora não sem alguma incomodidade algures entre a mais vítrea apatia e um resmoneio comedido. A cólera já não me seduz com a capitosa doçura dos seus vinhos. Ainda que rutilem, os clarões da juventude encontram eco no tamanho e distância da irrealidade dos horizontes que ladeiam por trás e pela frente um corpo parado, como nuvem de pó, num ponto inexacto do excessivo espelho dos caminhos da experiência. Hoje, enquanto te escrevo, mulher por vir e, espero, ficar de vez, busco apenas aprender a amar a vida que tenho e de que apesar de tudo ( dos homens, de mim mesmo, da imaginação de que duvido, do silêncio que desmereço) sou digno. Como Cícero, sonho com um coração maduro antes de um coração velho. Conquanto tudo ainda valha a pena, necessidade e desejo descem agora à altura dessa ridícula, honesta, porventura comovente pequenez.

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